Nosso DNA é uma molécula de certa forma simples, pois é formada por nucleotídeos compostos por apenas 4 bases: A, T, C e G. Mas a regulação da expressão dos nossos genes é algo complexo. Faz parte desses mecanismos de regulação a herança epigenética.

Mas afinal, o que ela representa?

Pois é esse assunto que vamos falar neste artigo. Segue aqui com a gente!

Fundamentos da herança epigenética

As mudanças nos nossos genes podem acontecer de várias formas. Pode ser por meio de mutações e polimorfismos, por exemplo, em que há substituições das bases que formam a sequência do DNA.

Mas também há mudanças químicas que não afetam a sequência, mas sim a composição das bases – e é esse tipo de alteração que deu origem à epigenética

A palavra vem da junção do prefixo “epi” que significa “sobre” ou “por cima” e genética, que é o estudo dos genes.

O que acontece é que essas modificações químicas (como a metilação) são definidas de acordo com nossa resposta aos estímulos externos, o que pode perdurar por algum tempo, ou de forma definitiva, por toda a vida.

E isso tem um impacto enorme, pois afeta como nossos genes se expressam, podendo deixar de serem ativos, ou em outras palavras, serem silenciados.

Como pode ser entendida a herança epigenética? 

“Herança Celular”

Herança é tudo que se adquire a partir dos nossos antecessores, sendo uma das principais bases da genética. E isso envolve as linhagens celulares que formam nosso organismo.

Quando nossas células se multiplicam, as células novas que são geradas são comumente chamadas de “células filhas”, que obviamente adquirem o patrimônio genético das “células mães”, que as originaram.

A epigenética entra aqui como um fator decisivo, pois as marcas bioquímicas no DNA fazem com que os mesmos tipos celulares expressem os mesmos tipos de genes. Isso permite que células de um determinado órgão se comportem da mesma forma, mantendo sua homogeneidade, sem expressarem genes de outros órgãos. 

Assim, as marcas definitivas no DNA determinam a função que elas devem desempenhar, tendo todas essas células um mesmo tipo de “assinatura genética”.

[Sem esse mecanismo, haveria uma bagunça danada no nosso organismo. Para mais detalhes, veja nosso artigo de epigenética.]

Dessa forma, a herança epigenética que acontece entre as células é essencial para manter a ordem do funcionamento global do nosso corpo. 

“De Pais para Filhos”

Muitos estudos de epigenética concentraram seus esforços para entender a obesidade nos filhos.

Obviamente o comportamento alimentar é reflexo das atitudes dos pais. Ser criado numa casa onde se come muita gordura saturada, alimentos de alta densidade calórica, e de forma desregrada causa um impacto nas crianças levando-as para o mesmo padrão  de consumo. 

Nesse caso, os pais podem apresentar obesidade e inevitavelmente seus descendentes serão afetados da mesma maneira, desenvolvendo a doença. Simples assim.

No entanto, há casos em que apenas os filhos são afetados e foi isso o que abriu os olhos dos pesquisadores. 

Hoje já sabemos que uma nutrição desequilibrada (tanto com uma alta quanto com uma baixa ingestão de alimentos calóricos e/ou nutritivos) durante a etapa pré-natal, e logo após o nascimento, pode causar o desenvolvimento de doenças crônicas na vida adulta.

E isso se deve a um tipo de “programação celular” que sofremos nas fases iniciais da vida, em que as marcas bioquímicas no nosso DNA podem estabelecer alterações metabólicas importantes pro resto da vida – e isso também é um tipo de herança epigenética.

Outro Conceito

Tem a ver com esse tipo de herança é o chamado “imprinting genômico”, que define se um alelo será expresso ou não dependendo da origem parental. 

Em outras palavras, a célula reconhece se o alelo vem do pai ou da mãe e deixa de expressar um deles. Um bom exemplo é o gene IGF2, que codifica um fator de crescimento celular. Em condições normais, apenas o alelo que vem do pai é expresso, e o que vem da mãe permanece silenciado por metilação. 

E caso os dois alelos comecem a se expressar, podem gerar danos ao organismo pois acontece uma proliferação celular anormal que potencializa o aparecimento de certos tipos de câncer. 

Aqui é bom esclarecer que esse tipo de controle da expressão gênica não é regra, pois em aproximadamente 99% dos genes, ambos os alelos (maternos e paternos) são expressos.

E esse exemplo de regulação é mais um modo de mostrar como a herança epigenética tem um papel essencial no nosso organismo, sendo um dos mecanismos de controle da saúde das nossas células.

Referências

Barker. The developmental origins of adult disease.The American Journal Of Nutrition, 2004.

Ornellas et al. Pais obesos levam a metabolismo alterado e obesidade em seus filhos na idade adulta: revisão de estudos experimentais e humanos. Jornal de Pediatria, 2017.